Desde 2012, pela lei 12.764, que institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), o autismo é reconhecido como deficiência para todos os fins legais, intervenção e diagnóstico precoce. A partir disso, outras leis foram criadas para estabelecer direitos às pessoas com autismo no Brasil, como direito à acompanhante escolar, benefício do INSS e carteira de identificação da pessoa com espectro autista.
De acordo com o Ministério da Saúde, o TEA é um distúrbio caracterizado pela alteração das funções do neurodesenvolvimento do indivíduo, interferindo na capacidade de comunicação, linguagem, interação social e comportamento. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), estima-se que pelo menos 2 milhões de brasileiros tenham autismo no Brasil. O dado, no entanto, pode não refletir a realidade já que o primeiro recorte de pesquisa sobre pessoas com autismo foi incluído no questionário de amostra do Censo 2020, que ainda não tem data para ser divulgado.
Giovanna Mayer, advogada especialista em direito à saúde e autismo, explica que, após a lei, conhecida como Lei Berenice Piana, as pessoas com TEA passaram a ter direitos em relação à educação, saúde, previdência, entre outros. A lei também garante tratamento multidisciplinar e reconhecimento como deficiência mesmo para casos em que há hipótese diagnóstica, quando o médico acredita no transtorno, mas ainda não tem meios de gerar o diagnóstico de forma definitiva.
Os especialistas explicam que, por serem consideradas Pessoas com Deficiência (PcD), todas as diretrizes da Lei Brasileira de Inclusão também são aplicáveis às pessoas que estão no espectro, incluindo atendimentos prioritários, estacionamento em vagas para pessoas com deficiência, entre outros.
Já a Lei Romeo Mion, sancionada em 2020, criou a Carteira de Identificação da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (Ciptea), facilitando a identificação visual por meio de um documento, emitido de forma gratuita por orgãos estaduais e municipais, e que garante prioridade no atendimento, acesso a serviços públicos e privados.
As pessoas com autismo também podem utilizar o Cordão de Girassol, sancionado pela Lei 14.624. O objetivo é facilitar a identificação de pessoas com deficiências ocultas através do uso de um cordão de fita com desenhos de girassóis.
Especialistas, ouvidos pelo Valor, destacaram os principais direitos da pessoa com autismo. Confira:
Segundo Franklin Façanha, advogado especialista em direitos da pessoa com autismo, além da garantia de acesso na escola regular, a legislação específica determina que as escolas não podem negar matrícula em razão do autismo, além de terem Plano de Ensino Individualizado (PEI) para os alunos que estejam dentro do espectro. “Qualquer negativa desses direitos pode ser considerado crime de discriminação, previsto no ART. 88 da Lei Brasileira de Inclusão, ou estatuto da pessoa com deficiência.”, diz Façanha.
A legislação também prevê o direito à acompanhante escolar especializado, em caso de classes comuns de ensino regular, e o oferecimento de Atendimento Educacional Especializado (AEE) em contraturno, a ser realizado em uma Sala de Recursos Multifuncionais (SRM).
No caso de acompanhante escolar especializado, Anna Carolina Dunna, presidente da Comissão dos Direitos dos Autistas e seu Familiares da OAB/RJ, explica que a lei refere-se a um profissional especializado. “Logo não é qualquer pessoa que vai desempenhar esta função, sendo dever da escola (pública ou particular) fornecê-lo sem qualquer cobrança por este serviço, para a família da criança”.
Segundo os especialistas, o Beneficiário de Prestação Continuada (BPC) também conhecido como LOAS, pago pelo pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), também abrange pessoas com TEA, desde que dentro dos critérios estabelecidos por lei, como não possuir renda superior a 25% do salário mínimo per capita e demonstrando que o autismo é um impedimento a longo prazo.
O primeiro passo é procurar o Centro de Referência em Assistência Social (CRAS) para fazer o Cadastro Único (CADÚNICO) e em seguida ir até o INSS para iniciar o procedimento administrativo no órgão.
“É bastante confundida com aposentadoria, mas são espécies diferentes. O BPC é um benefício assistencialista que é pago independentemente de contribuição para o INSS, já a aposentadoria acontece quando a pessoa autista trabalha, contribui para o INSS e posteriormente precisa se aposentar. Segue, nesse caso, a aposentadoria da pessoa com deficiência”, diz Mayer.
Em relação à saúde, a pessoa com autismo não pode ser excluída do plano de saúde em razão de sua condição, além de ter direito a atenção integral às necessidades de saúde da pessoa, com oferta de atendimento multiprofissional e acesso a medicamentos e nutrientes, explica Mayer. A garantia do direito, previsto em legislação, auxilia na obtenção do diagnóstico precoce.
A legislação determina, inclusive, que o tratamento de saúde para autistas deve ocorrer de maneira intensiva e precoce, mesmo que o laudo não tenha sido fechado, ressalta Façanha. “Importante destacar pois a partir dos 6 meses de idade, é possível identificar sinais característicos do autismo para que se inicie a investigação diagnóstica. A família ou pessoas próximas identificando, será necessário procurar um médico especialista, para que ele possa formalizar o diagnóstico e determinar quais terapias deverão ser manejadas”, explica Façanha.
No caso de intervenções terapêuticas que proporcionam a melhoria no quadro comportamental dos autistas, o plano de saúde deve obedecer às definições do médico que prescreveu as terapias, incluindo tipo de tratamento e quantidade de sessões.
Todos os direitos relacionados à saúde, envolvendo diagnóstico, intervenção precoce e tratamento multidisciplinar, que estão garantidos em lei, podem ser exigidos tanto do SUS como dos Planos de saúde e em qualquer faixa etária do beneficiário. Segundo Dunna, o direito a tratamento multidisciplinar deve acontecer, inclusive, depois da infância.
“É dever tanto do SUS como dos planos de saúde possibilitar o acesso destas pessoas aos seus tratamentos adequados e individualizados. Infelizmente temos notícias de operadoras de planos de saúde que vem cancelando os contratos com famílias que tem um beneficiário autista em tratamento. Esta pratica é totalmente abusiva e vem sendo revertida no Judiciário”, pontua Dunna.
De acordo com a Lei de Cotas para Pessoas com Deficiência, as empresas devem garantir uma cota de vagas de contratação para esse público, a depender do tamanho da empresa. Por conta do entendimento de que autismo é considerado uma deficiência, pessoas dentro do espectro podem se candidatar às vagas específicas para PCDs.
Além disso, há a possibilidade de redução na jornada de trabalho para servidores públicos. A Lei 8.112/90, no artigo 98, parágrafo 3º, permite que os servidores públicos federais que tenham filho com deficiência (PcD) possam ter redução de jornada de trabalho, sem redução na remuneração. Apesar de a lei abarcar apenas servidores federais, há um entendimento do STF de que a lei se estende, também, Aos servidores públicos estaduais e municipais.
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- Desconto na compra de veículos – A pessoa com autismo também tem direito ao desconto para aquisição de veículos e isenção de IPVA. Nesses casos será necessário passar por procedimentos administrativos junto ao DETRAN e a Secretaria da Fazenda, explica Façanha.
- Desconto em passagens aéreas – A resolução 280/2013 da Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) prevê o desconto para acompanhante de pessoa com deficiência. Para conseguir a redução no valor, é necessário preencher o formulário do FREMEC ou MEDIF nas companhias aéreas. O documento médico e o MEDIF devem ser avaliados pelo serviço médico do operador aéreo em até 48 horas da solicitação. O desconto pode chegar a até 80% do valor da passagem.
Em relação à desconto na conta de energia, Dunna explica que não há legislação nacional. Por isso, os responsáveis ou pessoas com autismo devem procurar a empresa concessionária da região que moram para saber se possuem direito ao benefício.