Considerado o homem mais rico do Brasil, Jorge Paulo Lemann, um dos sócios-fundadores da gestora 3G Capital, falou hoje publicamente pela primeira vez sobre a crise enfrentada pela Lojas Americanas. Sem mencionar nomes, citou a fraude contábil na companhia e afirmou que o momento é de recuperar sua governança.
Segundo Lemann, a varejista, com 30 mil funcionários, passou por uma grave crise e foi preciso “salvá-la”. O foco, agora, está em consertar os estragos e fazer com que a empresa volte a ser um negócio bem sucedido.
Em recuperação judicial e com dívidas que superam R$ 40 bilhões, a Americanas foi palco de uma fraude contábil revelada no início do ano passado. “Os problemas são, em geral, uma oportunidade para fazer melhor e seguir em frente”, afirmou.
Lemann prefere não usar a palavra fracasso, mas insucesso. Porque os insucessos, diz ele, não necessariamente são ruins, mas problemas a serem resolvidos e que representam oportunidades para descobrir onde houve falhas e como não repeti-las.
“É como perder uma partida de tênis. Você pensa sobre como fazer melhor nas próximas”, afirmou, em conversa com o professor Daniel L. Shapiro, autor do livro “Negociando o Inegociável” e um dos autores de “Além da Razão: Usando Emoções ao Negociar”.
Em outro momento, o empresário indicou que houve problemas relacionados a seguir apostando em um sistema de treinamento de lideranças dentro de casa: todos ficaram parecidos, pouco adaptáveis às mudanças em curso no mundo. Diante dessa percepção, o comportamento mudou e voltou-se a atrair competências de fora de casa, explicou.
Além do caso Americanas, Lemann e seus sócios na 3G, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, enfrentaram problemas em outras investidas nos últimos anos. Em 2019, quando ainda era comandada por Bernardo Hee, um dos braços direitos dos empresários, a Kraft Heinz viu seus resultados começarem a se deteriorar. Numa tentativa de estancar a piora de desempenho, a decisão foi por trocar o comando da companhia.
Questionado sobre confiança, disse que esse é um laço fundamental numa empresa e aquele que não se encaixa eticamente, não permanece no negócio. “Confiança é muito importante. No banco [Garantia], eram dezenas de sócios e nunca houve um problema legal, porque sempre esteve muito claro quais eram as regras”.
Nascido no Rio de Janeiro, o empresário lamentou os problemas de segurança enfrentados hoje na capital fluminense e lembrou com saudosismo dos tempos de surf, pescaria e tênis e da mãe “muito poderosa”, que proporcionou uma educação baseada em autonomia e independência.
Perguntado sobre os ensinamentos que vieram da prática de esportes, citou a noção de que é necessário muita prática até alcançar o sucesso, que as derrotas têm papel relevante nesse trajeto e que é preciso tomar riscos. “É algo muito importante. Aprender a tomar riscos e saber até onde ir”, disse.
Um dos aprendizados no mundo dos negócios, contou, foi o de que, normalmente, formação acadêmica e coragem de tomar riscos são inversamente proporcionais, e lembrou da resistência que encontrou, entre conhecidos com PhD, quando decidiu comprar a cervejaria Brahma, que mais adiante e após algumas outras aquisições daria origem à maior cervejaria do mundo, a Anheuser-Busch InBev (AB InBev).
A decisão de compra da Brahma, contou, foi tomada em uma tarde, mas depois de “dez anos” de análise e levou em conta não análise de fluxo de caixa ou projeção de resultados no longo prazo, mas os fatos de que o Brasil é um país quente, de população jovem e a empresa era mal gerida.
Segundo Lemann, na vida e nos negócios, vale o sistema dos “cinco objetivos básicos”, praticamente uma filosofia colocada em prática para simplificar o caminho e alcançá-los. E deixou um conselho aos estudantes de Harvard: “Estudar é bom, mas ainda tentaria relacionar isso à realidade. Você realmente aprende comentendo erros, e não apenas estudando”.
As palestras da Brazil Conference 2024 acontecem neste fim de semana nos auditórios da Universidade de Harvard e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), em Cambridge, Massachusetts.
A repórter viajou a convite da Brazil Conference